Crítica | Batman: O Cavaleiro das Trevas III - Raça Superior

"Acorde, Kansas. A moleza acabou", é isso o que Batman diz para o verdadeiro protagonista da terceira parte da saga Cavaleiro das Trevas: Superman. Por mais que o quadrinho tenha o nome do homem-morcego estampado nessa capa, essa provável conclusão para a história inicialmente criada por Frank Miller em 86 serve como a grande redenção para Clark Kent e um recomeço para Bruce Wayne. Se nesses últimos 30 anos, Miller carregou o fardo de ser o escritor que nunca foi muito fã do homem de aço, agora as coisas mudaram.
A história do quadrinho se passa algum tempo depois de O Cavaleiro das Trevas II, e traz um Batman ainda mais debilitado, agora à beira da morte. Entretanto, a aposentadoria de Bruce é interrompida mais uma vez quando o povo de Kandor, a cidade engarrafada por Brainiac, consegue ludibriar Ray Palmer para libertá-los e trazê-los para o tamanho normal. Finalmente livres das barreiras geométricas da cidade, o povo de Krypton assola o mundo abusando do poder que o Sol lhes dá. Nesse ínterim, Superman está congelado, sem nada poder fazer, restando apenas para Batman, sua ajudante Carrie Kelley e o que sobrou da Liga da Justiça impedir os kryptonianos.
Fugindo do roteiro fraco de Cavaleiro das Trevas II, Frank Miller faz uma viagem de volta aos anos 80 e resgata o melhor da HQ original para essa nova história. Miller não cuida do roteiro de nenhuma das nove partes, sendo encarregado do argumento, deixando a trama em si para Brian Azzarello (Novos 52: Mulher-Maravilha), mas toda a essência política, atemporal e satírica que era inerente à HQ de 1986 é trazida de volta para essa continuação, sinais claros da participação significativa de Frank. Azzarello mais uma vez se mostra um grande escritor, e acima de tudo, um escritor que entende muito bem a relação de seus personagens, seja explorando o relacionamento de Kal-El com sua filha, Lara, ou com sua amada, Mulher-Maravilha. Além dos relacionamentos do Batman, que mesmo ficando de segundo plano, têm suas desenvolturas.
O grande ponto alto da HQ é como Miller e Azzarello, juntos, conseguem dar ainda mais fôlego para a história de Bruce Wayne e de certa maneira, concluir a de Clark Kent. Diferente do quadrinho de 86, Superman não tem mais sua áurea autoritária e egoísta, remetendo muito mais para o herói que todos conhecem. O que mais impressiona, é que mesmo tendo 79 anos de história, ainda há elementos inexplorados nesse Superman e Miller os evidencia muito bem, além do fato de que cria uma nova noção de poder para o super-herói. E não só isso, mas também como ainda há muito o que explorar entre Clark e Bruce. Até porque, essa história é basicamente sobre os dois e sobre como eles lidam com problemas de maneira diferente.
A maneira como o quadrinho conversa com a realidade, assim como a de 86 o fazia, também é muito oportuna. Ligar os vilões que vem de Krypton a terroristas que vem do Estado Islâmico, e as constantes aparições de Hillary Clinton e Donald Trump são apenas alguns dos exemplos bem pontuados na HQ, e que dialogam muito coerentemente com a vida real. Frank se mostra, mais uma vez, como um escritor que entende o momento em que está vivendo e consegue - assim como fez durante os anos 80 e 90 -, conciliar uma história fictícia ressaltando relatos verdadeiros.
Diferente da primeira parte dessa trilogia, Batman não é o personagem mais interessante. Carrie Kelley mais uma vez se destaca como a Robin mais consistente de todas - mesmo que Dick Grayson ainda seja meu favorito - e se mostra uma personagem digna de assumir o manto do homem-morcego se algum dia isso for necessário. Entretanto, o verdadeiro destaque fica para Superman, que em tempos como os dias de hoje em que o personagem está morto no cinema e cada vez mais se torna uma sombra de Batman, se mostra o herói que a Terra precisa. Não há mais discussões sobre quem venceria numa luta entre Clark e Bruce porque assim como fica claro nessa HQ, nunca seria uma luta real. Superman finalmente se mostra como apenas um super-garoto que veio do Kansas ao mesmo tempo em que é o ser mais poderoso do planeta. É o típico herói que faz parte da raça superior (Kryptonianos), mas nega isso para que possa se misturar no meio de humanos falhos. Não é à toa que o personagem foi criado como um tipo de representação de Jesus Cristo. E depois de anos sendo injustiçado, ele tem o desfecho que merecia.
Batman: O Cavaleiro das Trevas III - Raça Superior é uma ótima história. É fiel ao universo criado 31 anos atrás por Frank Miller ao mesmo tempo em que é muito inovador. É uma história em quadrinhos nostálgica, corajosa e que dialoga com os tempos atuais por meio de várias entrelinhas. É a conclusão a uma trilogia que conta a história de dois homens e seu relacionamento conturbado: Batman e Superman, servindo de renascimento para um deles e conclusão para outro. O Cavaleiro das Trevas finalmente recebe a continuação que merecia e finaliza a história de maneira grandiosa, abrindo caminhos para possíveis continuações, mas também podendo servir de acabamento para uma trilogia memorável.

Argumento: Frank Miller
Roteiro: Brian Azzarello
Desenho: Andy Kubert
Editora: DC Comics