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Crítica | Eu, Tonya


2017 foi um ano de revelações. A casa caiu em Hollywood, vozes foram encontradas e a indústria cinematográfica abriu caminho para transformações. Sob influência desse contexto de grandes proporções, filmes sobre histórias reais, mulheres reais, foram aclamados pelo público. 2018 chegou para dar continuidade a esse ciclo necessário, e já promete trazer novas perspectivas. A história contada em Eu, Tonya é certamente uma delas; não há imparcialidade que resista à experiência de conhecê-la. O que posso dizer? Não foi minha culpa.


Tonya Harding, protagonista do longa que frisa a identidade em seu nome, foi uma patinadora famosa na história dos Estados Unidos nos anos 70. Primeira mulher a dar o triplo Axel, salto mais desafiador do esporte, ela competiu nas Olimpíadas duas vezes e teve a carreira arruinada pela acusação de ser cúmplice no planejamento de um ataque à uma das concorrentes. E isso não é tudo; há muito mais abaixo desta superfície sintética.


Notando o potencial e a força dessa personalidade marcante, o roteiro de Steven Rogers, combinado à direção minuciosa de Craig Gillespie (A Garota Ideal) decidem lapidar este material bruto especialmente para as telas de cinema. Trabalhar baseado em uma biografia já é um desafio por si só, geralmente representando caminho condenado à fórmulas prontas e técnicas que ressaltam a jornada do herói trilhada pelo personagem protagonista. Rogers e Gillespie, no entanto, optaram por rasgar as cláusulas invisíveis do gênero, transformando a vida em uma verdadeira obra de arte.


Para além do enredo bem construído e coerente, a forma como o longa desenvolve a narrativa é o que torna a trajetória de Tonya irresistível, captando a atenção desde os primeiros até os últimos instantes do longa de duas horas de duração. O segredo talvez esteja na maneira como o filme se relaciona com o espectador; Repleto de frases direcionadas, ele insiste em transformar você em um personagem da trama, seja através de menções diretas ou interações durante o desenvolvimento da cena quebrando a quarta parede.


As técnicas pouco comuns em filmes biográficos conquistam, mas o que realmente impressiona é a combinação delas com as atuações memoráveis, especialmente de Margot Robbie (Esquadrão Suicida), vivendo a protagonista, e Allison Janney (The West Wing) - que recentemente conquistou o Globo de Ouro pelo papel de LaVona. Tanto Robbie quanto Janney compreenderam as particularidades excêntricas de suas personagens, e cada uma à sua maneira, contracenaram brilhantemente com a realidade que lhes foi emprestada. Sebastian Stan (Jeff), Julianne Nicholson (Diane) e Paul Walter Hauser (Shawn) também destacaram-se com carisma e intensidade, compondo o núcleo principal da trama.


Quanto ao enredo, no que toca a dinâmica do roteiro, pode-se afirmar que encontra força na maneira fluída e no tom irônico com que se refere à questões polêmicas. A história de vida de Tonya poderia ser resumida em apenas uma palavra: Injustiça. Não é a toa que sua frase de efeito é: “Não foi minha culpa”. O longa trata de relações abusivas de uma maneira inteiramente realista, mostrando a dificuldade de desvencilhar-se delas. Além disso, usa dos desafios particulares da protagonista para atingir dilemas universais; a hipocrisia e o hedonismo da sociedade americana; (“A américa precisa de alguém para amar...ou odiar”), as consequências da criação, o machismo e a justiça também fazem parte da sinopse dessa produção.


É impossível não deixar o impacto da narrativa tomar conta; o sentimento de revolta mescla-se ao humor ácido e cru que elimina qualquer chance de sair da sala de cinema ileso. Quem arriscaria dizer que a experiência de acompanhar a trajetória de um sonho transformado em pesadelo pode trazer ao mesmo tempo a tristeza e a leveza, a reflexão e o sorriso. Assim como muitas mulheres, Tonya encontrou a voz após enfrentar uma vida de julgamentos, e finalmente teve sua verdadeira história contada. Talvez seja parcial, mas é necessário dizer que Eu, Tonya certamente ocupará espaço dentre os melhores filmes do ano.



Direção: Craig Gillespie


Elenco: Margot Robbie, Allison Janney, Sebastian Stan, Julianne Nicholson


Duração: 2h 01min


Data de lançamento: 15 de fevereiro de 2018


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